sexta-feira, agosto 31, 2012

Dizes-me...


Dizes-me: tu és mais alguma cousa
Que uma pedra ou uma planta.
Dizes-me: sentes, pensas e sabes
Que pensas e sentes.
Então as pedras escrevem versos?
Então as plantas têm idéias sobre o mundo?
Sim há diferença.
Mas não é a diferença que encontras;
Porque o ter consciência não me obriga a ter teorias
sobre as cousas:
Só me obriga a ser consciente.
Se sou mais que uma pedra ou uma planta? Não sei.
Sou diferente. Não sei o que é mais ou menos.
Ter consciência é mais que ter cor?
Pode ser e pode não ser.
Sei que é diferente apenas.
Ninguém pode provar que é mais que só diferente.
Sei que a pedra é real, e que a planta existe.
Sei isto porque elas existem.
Sei isto porque os meus sentidos mo mostram.
Sei que sou real também.
Sei isto porque os meus sentidos mo mostram,
Embora com menos clareza que me mostram a pedra e a planta.
Não sei mais nada.
Sim, escrevo versos, e a pedra não escreve versos.
Sim, faço idéias sobre o mundo, e a planta nenhumas.
Mas é que as pedras não são poetas, são pedras;
E as plantas são plantas só, e não pensadores.
Tanto posso dizer que sou superior a elas por isto,
Como que sou inferior.
Mas não digo isso: digo da pedra, “é uma pedra”,
Digo da planta, “é uma planta”,
Digo de mim, “sou eu”.
E não digo mais nada. Que mais há a dizer?

("Pessoa", que amo em todas as suas formas)

sexta-feira, agosto 17, 2012

De Saint-Exupéry pra cá ❤



‎''Se tu amas uma flor que se acha numa estrela, é doce, de noite, olhar o céu. Todas as estrelas estão floridas."

Antoine de Saint-Exupéry

domingo, agosto 05, 2012

"Épico como o teu rosto"


"Quero o gozo de quem chora por amor
quero já como quem recebe um favor
rasga-me a camisa para não falar para os botões
e não ouças que eu não sou de opiniões

encurta-me a espera
entra-me no corpo já
lambe-me como quem se esmera
vou fingir que até estou cá

é que às vezes vou p’ra longe
p’ra uma terra que tu não sabes
fico lá a fazer de monge
e és tão linda que não cabes

adio-nos o encontro
dedilho-te um adeus
esses beijos todos meus
vais fazê-los com outro

rasgas-me o sangue
de um rubro negro que vai ter fim
e hei-de ficar exangue
quando morrer juntas-te a mim

iremos juntos à morte
a bordo de um cavalo cego
ver se nos querem na corte
estou vivo mas às vezes nego"

Poema do livro "a verdade dói e pode estar errada", de João Negreiros.
Quem quiser ouvir: aqui está o poema no youtube.